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terça-feira, 26 de março de 2024

"O Corvo", de Edgar Allan Poe






Imagem: Arquivo pessoal. Edgar Allan Poe.


Seu texto mais famoso é o poema narrativo O corvo (The raven), de 1845. Nesse poema, o narrador conta um episódio assustador ocorrido à meia-noite, quando, sonolento, e com saudades de Lenora, a amada morta, ouve baterem à porta de seu quarto. Entretanto, ao abrir a porta, ele não encontra ninguém. Na sequência, ouve outra batida, e, ao abrir a janela, encontra um corvo. Passa, então, a conversar com ele, que sempre responde: “nunca mais” (“nevermore”), como demonstra este trecho do poema traduzido por Machado de Assis:



                                                                                                    O corvo


Em certo dia, à hora, à hora
Da meia-noite que apavora,
Eu, caindo de sono e exausto de fadiga,
Ao pé de muita lauda antiga,
De uma velha doutrina, agora morta,
Ia pensando, quando ouvi à porta
Do meu quarto um soar devagarinho
E disse estas palavras tais:
“É alguém que me bate à porta de mansinho;
“Há de ser isso e nada mais.”

Ah! bem me lembro! bem me lembro!
Era no glacial Dezembro;
Cada brasa do lar sobre o chão refletia
A sua última agonia.

Eu, ansioso pelo sol, buscava
Sacar daqueles livros que estudava
Repouso (em vão!) à dor esmagadora
Destas saudades imortais
Pela que ora nos céus anjos chamam Lenora,
E que ninguém chamará mais.
[...]

Abro a janela, e de repente,
Vejo tumultuosamente
Um nobre corvo entrar, digno de antigos dias.
Não despendeu em cortesias
Um minuto, um instante. Tinha o aspecto
De um lord ou de uma lady. E pronto e reto
Movendo no ar as suas negras alas,
Acima voa dos portais,
Trepa, no alto da porta, em um busto de Palas;
Trepado fica, e nada mais.

Diante da ave feia e escura,
Naquela rígida postura,
Com o gesto severo, — o triste pensamento
Sorriu-me ali por um momento,
E eu disse: “Ó tu que das noturnas plagas
Vens, embora a cabeça nua tragas,
Sem topete, não és ave medrosa,
Dize a teus nomes senhoriais;
Como te chamas tu na grande noite umbrosa?”
E o corvo disse: “Nunca mais.”
[...]

“Profeta, ou o que quer que sejas!
Ave ou demônio que negrejas!
Profeta sempre, escuta: Ou venhas tu do inferno
Onde reside o mal eterno,
Ou simplesmente náufrago escapado
Venhas do temporal que te há lançado
Nesta casa onde o Horror, o Horror profundo
Tem os seus lares triunfais,
Dize-me: existe acaso um bálsamo no mundo?”
E o corvo disse: “Nunca mais.”

E o corvo aí fica; ei-lo trepado
No branco mármore lavrado
Da antiga Palas; ei-lo imutável, ferrenho.
Parece, ao ver-lhe o duro cenho,
Um demônio sonhando. A luz caída
Do lampião sobre a ave aborrecida
No chão espraia a triste sombra; e fora
Daquelas linhas funerais
Que flutuam no chão, a minha alma que chora
Não sai mais, nunca, nunca mais!

 


Por Edgar Allan Poe.

Tradução: Machado de Assis.

Reproduzido por Moisés Calado. 



 

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